
“Toda vez que nasce uma criança, nasce com ela uma mãe.” Essa sentença é proferida por algumas mães quando querem expressar a transformação que ocorreu com elas ao terem seus filhos, mas também com o intuito de tranquilizar as grávidas preocupadas, e todas aquelas mulheres que dizem não estar prontas para tão grandiosa tarefa. Mas também é possível dizer que toda vez que nasce uma criança, nasce com ela um pai? E parece que não. Por quê?
Todos sabemos que, nos tempos que correm, são muitos os discursos intoxicantes, presentes em toda parte e que se esforçam por nos cercar e confundir, e é abundante a fumaça gerada em volta de realidades que sempre foram óbvias, a fim de ofuscar verdades basilares para que as pessoas fiquem desorientadas. Por isso é preciso algum esforço para enxergá-las. Mas há muita gente sinceramente engajada em engrossar as fileiras de uma militância do senso comum, um apostolado das coisas evidentes. “A grama é verde”, deve ser o nosso lema, ecoando o velho Chesterton. A grama é verde, sim; a grama é verde, o céu é azul, e homens e mulheres são diferentes. Portanto, assim como é diferente a educação das meninas e a dos meninos, os papéis sociais e familiares ligados a cada um dos sexos também serão diferentes, e a atuação do pai e da mãe, a sua função na educação das crianças, como em tudo o mais na família, é complementar.
É preciso reafirmar, além do mais, que pai só pode ser um homem, um varão, uma pessoa masculina, e que um bom pai só pode ser um homem bom, quero dizer, só será um bom pai o homem que tiver conquistado as virtudes exclusivamente masculinas. Não podemos acreditar naqueles (ou, melhor dizendo, naquelas) que consideram que ser pai nada mais é do que um “papel cultural” um pouco fluido, que pode ser adaptado, substituído ou desempenhado por uma mulher. Se a própria observação da realidade não convencer, já temos estatísticas suficientes, trazidas por uma porção de pesquisas. E, receio dizer, os números são cruéis. Mas muita atenção: isso é o contrário de um julgamento das mães solteiras, ou de mulheres que tenham se desdobrado para assumir, na vida de alguém, o vazio deixado por um pai ausente, ou de quaisquer outras situações difíceis. O que digo deve ser compreendido como um compadecimento com a dificuldade de sua empreitada que, segundo as pesquisas, tem bem menos chances de ter sucesso; é um louvor ao seu imenso esforço, isto é, o esforço por dar àquela criança o que, a rigor, somente um pai pode dar.
Um bom pai só pode ser um homem bom, quero dizer, só será um bom pai o homem que tiver conquistado as virtudes exclusivamente masculinas
Mas, para além dessa ausência, propriamente, ou dessa tentativa de substituição, existe hoje uma grande confusão sobre qual seja, exatamente, o papel do pai; e não somente os homens, mas os casais ficam bastante perdidos e enfrentam dificuldade e conflitos, desentendem-se e brigam, sem saber como articular algumas demandas e pautas da “igualdade dos sexos”, que, quando se tenta aplicar na realidade concreta de uma família, fazem com que a conta não feche. Ora, o que um pai deve fazer, ou não fazer? Deve brincar com os filhos, ou ser sempre sério? Até que ponto e de que modo deve se envolver em determinadas questões, qual sua função no cuidado dos bebês, na educação das crianças? Aqui devemos, novamente, resgatar o óbvio perdido: os comportamentos paternos e maternos não foram inventados arbitrariamente; eles são o resultado razoável da natureza e do comportamento humano. Ser pai e ser mãe é algo que está, num sentido muito profundo e universal, arraigado na própria essência de ser homem e mulher. É por isso que não se pode dizer, no mesmo sentido, que “quando nasce uma criança, nasce com ela um pai”.
Anthony Esolen diz o seguinte: “O menino não vira homem do nada, pois a masculinidade é uma realidade cultural construída sobre uma base biológica, ao contrário da feminilidade, que é uma realidade biológica com expressão cultural. A diferença é crucial. São Josemaría Escrivá dizia com clareza a seus seguidores homens: Esto vir! –Seja homem, e sabemos o que essa exortação significa. Até as feministas sabem, e tremem. Significa que, em qualquer momento da vida de um homem, sua masculinidade será julgada, confirmada ou cancelada, para ser reconquistada, de novo e de novo. Um homem pode perder para sempre o direito de estar ao lado dos outros homens. Ele pode sucumbir até deixar completamente de ser homem”. Reparem na distinção, que ele julga crucial: ser mulher é “uma realidade biológica com expressão cultural”, ao passo que ser homem é “uma realidade cultural construída sobre uma base biológica”.
As mulheres têm todo o seu ser impregnado de maternidade. Nós carregamos dentro de nós aquele novo filho que foi concebido e gerado no nosso ventre. Isso já estabelece vínculos psicológicos e afetivos, que depois serão refinados e irão se tornando mais racionais, mas que apoiam o enfrentamento e a compreensão dos nossos deveres maternos. O cordão que liga o nosso filho a nós é material, palpável. Com vocês, caros pais, não é assim. Para os homens, tomar clara consciência da própria paternidade será, na maioria dos casos, um processo bastante racional – assim como é racional quase tudo o que os homens fazem e como recebem aquilo que lhes acontece, por natureza. Assim, assumir sua paternidade não será, para o homem, uma transição, um florescimento. Será uma atitude, um gesto – um corte.
Durante a gravidez, o homem pouco sente ou se altera; com exceção da sua breve participação biológica no início do processo, ele já não volta a sentir biologicamente nada relacionado à sua paternidade até que o filho nasça. Pode, sim, ficar impressionado ao sentir os chutes da criança na barriga ou ao vê-la no ultrassom, e até sonhar um pouco com o futuro, mas, durante os nove meses, não sentirá ainda o gosto, não experimentará o afeto concretíssimo de sua futura paternidade. E daí vêm as cenas correntes nos filmes, do pai perplexo na maternidade, amparado pelos amigos que lhe oferecem um charuto. De fato, é com o nascimento do filho que o pai sente a concretude da sua responsabilidade. Só quando toma o filho nos braços que é, de uma só vez, invadido por uma multiplicidade de sentimentos que o farão, por algumas horas, sentir-se o homem mais feliz do mundo, e um ser como que embriagado de paternidade... Entretanto, isso ainda não é a sua paternidade, de fato. Os pais de primeira viagem podem não saber, mas esse é apenas o convite que lhe é feito pela vida.
A menina, para tornar-se mulher, deve aprender a se comportar como uma mulher. Deve aprender a expressar a sua feminilidade, a cultivá-la; encontrar a “expressão cultural” de sua “realidade biológica”. Mas a própria realidade biológica abre o caminho para o seu amadurecimento, e todos sabemos qual é o momento em que se costuma dizer que uma menina se tornou mulher: ela passa a poder conceber, passa a poder ser mãe. A menina vive desde pequena entre as mulheres, e é aos poucos absorvida no mundo dos adultos. O corpo do menino também se transforma na puberdade, é verdade; mas isso não é motivo suficiente para que ele seja considerado homem. O menino, que durante a infância foi cuidado pelas mulheres e permaneceu entre elas, deve conquistar o direito de andar com os homens, de correr riscos por si mesmo, e pelos outros. Nas culturas tribais e tradicionais, a mulher não tem um rito de iniciação, como os rapazes. Estes, sim, precisam atravessar um teste, provar que sua masculinidade está madura, e agir sempre conforme a essa condição. Bem, para ser pai é preciso antes ser homem, e, de algum modo, é sendo pai que o homem se faz mais homem, pois a paternidade corresponde à maturidade da masculinidade, mesmo que não se tenha filhos biológicos – o que, como já dissemos, para a masculinidade é um mero detalhe.
Logo percebe que o chamado da vida para a sua nova responsabilidade, quando vê a mulher puérpera com o filhinho nos braços, não é propriamente dentro de casa, mas fora. Será melhor se outras mulheres cuidarem dela e a ajudarem ali. O homem, o pai, é a figura que sai de casa, que vai caçar, trabalhar, prover; é quem vai buscar, no mundo, aquilo de que os membros da família precisam dentro do lar. É o que sai ao amanhecer com a esperança, o que volta ao pôr do sol com a consolação. Sendo mais forte e menos vulnerável, não estando fisicamente ligado aos filhos e à sua amamentação, ao seu cuidado imediato, o homem dispende dessa sua “liberdade” corporal em prol da família: ele se arrisca, no mundo dos perigos, das ameaças, dos enfrentamentos etc., para prover.
É com o nascimento do filho que o pai sente a concretude da sua responsabilidade. Entretanto, isso ainda não é a sua paternidade, de fato. Os pais de primeira viagem podem não saber, mas esse é apenas o convite que lhe é feito pela vida
E quando está em casa, ao contrário, esse homem ocupa espaço, é uma presença forte, definidora. Sim, e não há nada de errado nisso, e não quer dizer que essa presença seja, como se diz hoje pejorativamente, “opressora”. Está inscrito no seu próprio corpo ser maior, ser mais forte, ser expansivo, afirmativo, e marcar sua presença no espaço. Poderíamos até nos arriscar a dizer, guardando as proporções individuais, que, se o homem não apresenta em casa nenhum desses traços, é porque talvez não esteja se comportando tão conforme à sua masculinidade, e sim um pouco parecido com a mãe – emasculado. Por isso é saudável, mesmo, que o homem passe menos tempo em casa, para que a sua presença possa ser vivida e apreciada como merece. É claro que isso não quer dizer que o homem não tenha funções em casa, e que não deva ajudar a mãe nas tarefas domésticas. O homem pode, e deve, ajudar a esposa em tudo o que ele puder e ela precisar. Mas, se isso o estiver impedindo de trabalhar mais, ou de se dedicar mais fora de casa, para que a vida em casa seja melhor, essas atividades estão deslocadas. E, nessa sua presença em casa, a sua convivência com os filhos será, também, evidentemente, diferente da que eles têm com a mãe.
O seu jeito de amar é outro e, portanto, também será outro o seu jeito de educar. Convém que os homens mantenham os seus traços masculinos característicos: seus modos de fazer mais sistemáticos, mais diretos, ordenadores — mais ásperos, mais concretos. O seu jeito de dar uma ordem, ou de repreender, e o seu jeito de elogiar e reforçar uma atitude boa, tudo isso é muito diferente de como a mãe faz. E, explorando essas capacidades afetivas que lhe são próprias, o pai representará, e de fato será, para os filhos, o símbolo e a presença de elementos fundamentais: o limite, o incentivo, o ideal, a força. O olhar afirmativo de um pai diante de nosso comportamento, ou o aperto firme dos ombros, dá tranquilidade e segurança ao filho. Seus conselhos e palavras de encorajamento darão impulso e confiança para enfrentar qualquer dificuldade. E, assim, mesmo quando não está em casa, esse pai vai, de algum modo, permanecer ali, não fisicamente, mas será, junto com sua esposa, o principal habitante e o possuidor daquele lar familiar, com suas regras e princípios permanecendo mesmo quando não está presente. Não há nada que um pai possa desejar mais: que, na sua ausência, tudo continue sendo feito como quando ele está lá, porque suas diretrizes foram tão claras, boas e bem acolhidas por seus filhos que não lhes custa nada cumpri-las. Isso vale para o tempo que passam fora trabalhando; mas vale ainda mais para o dia em que não estiverem mais nesta Terra.
Enfim, para que ninguém me acuse de falar do que só conheço desde outro ponto de vista, e que falo dos homens sem estar no devido “lugar de fala”, traduzo um belo trecho de um homem – de James B. Stenson, no livro To Be a Man: Life Lessons for Young Men (2012), com sábios conselhos para o homem em busca de amadurecer, e de tornar-se, como ele chama, um parent-leader, o “pai-líder”. Diz ele:
“O marido coloca sua esposa em primeiro lugar. Em suas prioridades, a felicidade e o bem-estar dela são sua principal preocupação, e seus filhos sabem disso. Eles sabem disso porque ele os guia pelo seu próprio exemplo a amar, honrar e obedecer a sua mãe. Se deixarem de fazê-lo, responderão a ele por isso (isso é mais do que a metade do segredo da paternidade eficaz: esforçar-se para viver como um marido dedicado e carinhosamente solícito). Os pais corrigem as falhas de seus filhos, não a eles pessoalmente. Eles ‘odeiam o pecado, mas amam o pecador’. Eles combinam correção e punição com perdão afetuoso, compreensão e incentivo. Eles não são fracos nem rígidos, mas sim carinhosamente assertivos. Eles amam seus filhos demais para deixá-los crescer com suas falhas infantis e egoísmo ainda intactos. Quando precisam corrigir alguém na família, fazem-no, sempre que possível, pessoal e discretamente. Eles não repreendem as pessoas em público. O pai jamais teme ficar ‘impopular’ com seus filhos. A felicidade a longo prazo das crianças é mais importante do que o resmungo e os atuais sentimentos feridos causados pela correção. Os pais têm confiança de que o ressentimento de seus filhos logo passará; um dia, por graça de Deus, as crianças entenderão e agradecerão ao pai pelo amor por trás de sua firme orientação. Os pais entendem que devem conduzir seus filhos a enxergar o invisível – aquelas realidades decisivas que fazem uma vida grandiosa: caráter, consciência, honra, integridade, espírito de serviço, verdade, justiça, deveres morais, deveres sociais, solidariedade familiar, a alma.”
As pistas para a resposta estavam o tempo todo na nossa cara, em todas as canecas de Dia dos Pais, nas lembrancinhas das escolas, nos cartões, nas canções piegas. O homem, para que nasça como um pai para os seus filhos, deve tornar-se o seu herói, para o qual eles olhem desde baixo, encantados. Não um herói de capa e superpoderes, mas forte, certamente, cuja força os meninos queiram imitar e sob a qual as meninas queiram se abrigar. Mas o que é ser forte de verdade? Não é parar um trem em movimento, nem destruir, de um só golpe, uma montanha – ainda que essas coisas possam ser bons símbolos para o que sentem às vezes. E também não se trata de executar, com máxima eficiência, as caçadas do mundo: ocorre de homens muito bem-sucedidos, ricos e poderosos serem péssimos pais. A força do pai atravessa e transcende esta: ele é robusto e competente, mas sabe ser doce e contido. Ele sai para produzir e prover, mas guardando sempre em seu coração, como num relicário, a lembrança do lar. É para o lar que ele trabalha, às vezes tão longe. Bravura e audácia, sim, mas também humildade e resignação, cada uma ao seu tempo; fortaleza na tormenta, mas mais fortaleza por não trazer para casa os temores e as irritações da rua, da vida “lá fora”, onde se conquista o sustento. Não é quando nasce o bebê que nasce o pai, portanto; mas é quando o homem decide guardar, dentro do peito, o dever de se fortalecer e de usar sua força para amar e defender; usá-la para o outro, e nunca mais para si. E, assim, é sob esse prisma de amor que ele mostrará aos seus filhos o mundo, do qual eles não terão medo, por mais temível que seja. “Sê simples e piedoso como uma criança, e rijo e forte como um líder”, diz-nos o mesmo Josemaría Escrivá.
Repito, o fato de a participação biológica do homem na geração da criança ser ínfima é um grande símbolo para o fato de que esse não é o centro da coisa. E é difícil distinguir o homem maduro do pai, pois ser pai passa por ser homem, e ser homem não difere, na essência, de ser pai. Seja você ou não o pai biológico dos seus filhos, ser o pai de alguém, tanto quanto ser homem, é um grande gesto de liberdade, um gesto livre de afirmação, e de doação. É preciso assumir os seus filhos. Lembremos sempre, como exemplo, do melhor pai que já existiu – e digo isso sem ressalvas, visto que foi o homem que Deus escolheu para ser o seu próprio pai, José, o carpinteiro, e que não era pai biológico. Do mesmo modo Deus escolheu você para ser o pai dos seus filhos, porque confia em você para isso. Todos precisam, por um gesto próprio de vontade e de coragem, fazerem-se pais; ser homem o bastante para se tornarem pais. Ouçam, todos, a voz do verdadeiro Pai, que, com a firmeza e a doçura perfeitas, que esperamos ver refletidas num bom pai, propõe a vocês um convite — que dói e exige esforço, mas que encerra a sublime gratificação de parecer-se com Ele: Seja homem! Seja pai.
Feliz Dia dos Pais!
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